“Mas chega a ser embaraçoso ver os socialistas, por vezes os mesmos que no governo, em 2010 e 2011, defenderam e executaram os cortes de salários da função pública, congelaram o salário mínimo nacional, congelaram as pensões, cancelaram os quarto e quinto escalões do abono de família, aumentaram todas as taxas do IVA, incluindo a normal de 21% para 23%, propuseram e se comprometeram com a retirada de benefícios fiscais às famílias no âmbito da educação, da saúde e da habitação, aprovaram o agravamento do IMI, e por aí fora, apresentarem-se agora como os agentes de uma política patriótica e progressista que aposta no crescimento da economia e combate a maldosa austeridade que eles mesmos iniciaram. E julgam que repetindo esta falsificação descansam os espíritos inquietos, que, no fundo, sabem que a austeridade não é de esquerda nem de direita, é o que sobra quando acaba o dinheiro.”
Citámos parte de um discurso que devolveu a verdade aos mais desmemoriados. E que desmentiu aqueles que, tendo a memória bem tratada, optam pela inverdade como instrumento de ação política.
Pedro Passos Coelho, sem se desviar um milímetro da correção na atitude, falava no final do debate da generalidade do Orçamento de Estado para 2016. O seu discurso contrastou com o tom comicieiro que invadiu a bancada dos socialistas. Curiosamente, ainda mais “carroceira” do que as da extrema-esquerda radical que apoia o governo. Um tom que que se estendeu aos membros do governo. E, inacreditavelmente, também a Costa.
Foi um debate com algo de atípico. Como atípica é a proposta de Orçamento de Estado, agora em debate na especialidade. Começou por ser uma sucessão de esboços apresentados à Comissão Europeia. Redundou num documento que foi objeto de diversas erratas. Erratas de erratas que chegaram a ter a dimensão de um quinto do próprio documento orçamental.
Digamos, no entanto, que reuniu alguma unanimidade. A de ser um documento em que ninguém acredita. Como alguém, isento, inteligentemente o caracterizou. Tudo isso depois de se terem pronunciado o Conselho de Finanças Públicas, a Unidade Técnica de Apoio Orçamental e um conjunto alargado de entidades nacionais e internacionais, atuando nas mais diversas áreas. Culminou com uma “novela de Bruxelas”, que todos seguimos, durante diversos dias, perante a Comissão Europeia.
Aliás, a “novela de Bruxelas” ainda não chegou ao seu episódio final. Se a apreciação acabou com chamadas de atenção e dúvidas de exequibilidade sobre a última versão que Costa e Centeno levaram de Lisboa, em Abril haverá novos desenvolvimentos. Por isso, Costa e Centeno, embora desencontrados nas palavras, andam a trabalhar num Plano B. Que, curiosamente, os apoiantes radicais tentam desesperadamente dizer que não existe.
Mas existem, para já, duas conclusões a retirar.
A primeira é relativa à falta de verdade. Com efeito, a austeridade já vem de longe. Vem de Sócrates. E é aumentada com a proposta agora em discussão.
A segunda tem a ver com uma doença de que sofre a dita proposta. É que, à exceção do governo e dos seus apoiantes radicais, todos entendem que tem falta de credibilidade.