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Quem conta um conto acrescenta-lhe um ponto.

É o que se costuma dizer quando contamos a alguém uma história de que outro nos deu conhecimento. Mas podem crer que o que vamos contar de seguida corresponde exatamente ao que nos foi transmitido.

Então, é assim. Num encontro casual na baixa de Ponta Delgada, na passada sexta-feira, um empresário, de um setor que não podemos identificar, abordou-nos. Conhecemo-nos há vários anos, mas nunca tivemos longas conversas. Ficamo-nos, normalmente, pela saudação educada de quem se encontra na rua. Desta vez, contudo, foi além disso.

Invocou o que escrevemos na semana passada a propósito dos atrasos de pagamentos do Governo Regional, bem como do clima de receio de represálias que se encontra instalado. E quis confirmar que, com a sua empresa e, tanto quanto sabe, com muitas outras, da sua área de negócio e não só, é isso que há muito tempo se passa. No seu caso, o governo está em falta consigo há mais de um ano em montantes muito significativos. Correspondem a uma larga fatia da sua faturação.

Disse ainda que, face ao elevado volume de pagamentos em atraso, se tinha dirigido ao departamento do Governo Regional a quem tinha feito os correspondentes fornecimentos, mas não teve êxito nas diligências que efetuou. Pelo contrário. Recebeu apenas desculpas e a promessa de que, “logo que recebermos ordens, o dinheiro ficará à sua disposição”. Mês após mês, a resposta foi sempre a mesma.

E assim foi andando. Meses a fio. Até que a iminência de ter que despedir alguns colaboradores da sua empresa o levou a ir mais além.

Ganhou coragem e disse que ia pôr o caso nos jornais. Simpaticamente, foi-lhe dito para não se “meter nisso”. Seria pior. É que só duas coisas poderiam acontecer. De forma nua e crua, foi esse o aviso.

Ou o pagamento seria ainda mais estendido, a título de castigo pela ousadia. Ou lhe pagariam uma pequena parte da dívida para “disfarçar e tapar a boca”, sendo mais do que certo que, a partir desse momento, nunca mais seria chamado a apresentar uma proposta de fornecimento.

Como o Governo Regional é o seu cliente de maior peso, isso corresponderia à morte da empresa. Foi o que pensou, tratando de se ajustar à medida imposta pelo receio que lhe incutiram.

Dispensou alguns trabalhadores e, com enorme dificuldade, conseguiu um pequeno financiamento que lhe permitiu “aguentar” mais uns meses. O resultado foi desastroso. Aumentou os seus encargos, na medida dos juros que passou a acrescentar à sua folha de pagamentos, e está agora, como nos disse, ainda mais “atrapalhado”.

O “calote” do governo mantém-se intacto e a parte mais significativa dos excelentes colaboradores que tinha consigo está a receber subsídio de desemprego.

É esta a triste realidade de uma importante parte do tecido empresarial açoriano. Com contas por pagar por parte do governo e “caladinhos, com medo de que o mal que vem seja ainda pior”.

Fique descansado, caro Amigo Empresário. Neste texto em que contamos a sua história tivemos o cuidado de não o tornar identificável.

Por isso, não acrescentámos um ponto ao seu conto. Até lhe tirámos. Para não o penalizar.