A crise do leite e outras crises que nos calharam… – Opinião de Luís Rendeiro

Primeiro foi a crise da construção civil. O fim das obras, pequenas ou grandes, chegou de mansinho, teve efeitos devastadores e deixou um rasto de falências, desemprego e desespero num incontável número de famílias.

Tem origem na construção civil, ou nos negócios dela dependentes, a maior parte dos desempregados da Região (muitos deles com elevadas qualificações técnicas e académicas), dos beneficiários de apoios sociais ou dos programas de recuperação de emprego. Demasiados foram obrigados a emigrar…Os incumprimentos bancários e as penhoras deles consequentes, também encontram na crise da construção civil uma das causas de maior dimensão.

Não houve, à escala Regional, qualquer política de revitalização daquele sector, qualquer plano de acção, quaisquer medidas preventivas ou de mitigação…

Depois veio a crise da Base das Lajes… Perderam-se postos de trabalho, que não voltarão a ser criados enquanto não surgir um novo uso para a base, e perderam-se os dólares americanos na compra de serviços à economia local. Perderam-se mais empregos, fecharam mais empresas, ficaram vazias casas, lojas, restaurantes… Emigraram mais pessoas…

O Governo Regional inventou um plano de revitalização onde meteu tudo o que prometeu e não fez na Terceira em 20 anos, prometendo a conta para o Governo da República e para os americanos… Nada se viu… Nada aconteceu… Nem um cêntimo para a Terceira no Orçamento de Estado de António Costa.

Agora chegou a crise do leite… Mais uma “tempestade perfeita” que assola esta terra. Já há dez anos que se sabia que esta crise havia de chegar. Foram mais que muitos os avisos e os alertas feitos… Mas o Governo Regional sempre garantiu que tudo estava feito e pronto. Que os nossos agricultores estavam preparados e munidos dos meios e capacidades para lidar com o impacto do fim das quotas… Mas não estavam…

Os agricultores sempre cumpriram a sua parte. Seguiram pelos caminhos apontados pelo governo regional e cumpriram com as obrigações da indústria. Foram trabalhando cada vez mais e melhor, ganhando cada vez menos… Agora passaram a ter prejuízos.

Esta crise é diferente porque desde de 2006 se sabia que esta crise ia chegar aos Açores. Atribuíram-se milhões de euros em apoios, em modernização das explorações, em mecanização, apoiou-se a indústria e o transporte de produtos agrícolas… mas criou-se uma lavoura dependente de factores de produção que temos de importar, bem como uma gama de produtos lácteos sem diferenciação, sem valor acrescentado, sem nada que valide a sua qualidade perante produtos semelhantes oriundos de outro lugar qualquer.

Não basta ter o melhor leite do mundo se ele for transformado em produtos iguais a todos os outros sem sequer ter uma certificação de qualidade.

Mais do que nunca, é preciso um Governo Regional que encontre soluções e não desculpas. Esta crise, tal como as outras, veio para durar. Não vai passar depressa. Logo, exigem-se soluções locais e urgentes. Os agricultores não podem ficar à sua sorte, abandonados ao destino.

Não podemos continuar sem saber como se formulam os preços, quais as importações e exportações, não acompanhar os mercados e desconhecer o grau de autoaprovisionamento dos Açores. Isto é governar às cegas.

O PSD propôs e o PS chumbou a criação de um observatório de preços (para o leite e produtos agrícolas), a criação de uma interprofissional para o sector agrícola, uma representação dos Açores em Bruxelas ou a criação de novos produtos para a nossa indústria. O Governo Regional apenas distribuiu fundos comunitários.

Quem define as políticas e distribui os subsídios não se pode demitir das responsabilidades. Se o faz, ao fim de 20 anos de poder, é porque o seu tempo chegou ao fim.