Para que servem as eleições? – Opinião de Luís Garcia

1. Está em marcha um assalto ao poder em Portugal. Contra todos os princípios políticos e éticos e contra toda a tradição de 40 anos de democracia, os partidos que perderam as eleições estão a unir-se para inverter o que o povo disse nas urnas. PS, BE e PCP podem constituir uma maioria de deputados que pode ter legitimidade constitucional mas não tem legitimidade política. Esta adquire-se nas urnas e aqui, especialmente o PS foi fortemente derrotado nas eleições.

O Povo disse nas urnas que queria que o PSD e o CDS-PP continuassem a governar mas sem maioria absoluta. O Povo disse que queria que Passos Coelho continuasse a ser Primeiro-ministro e que a governação fosse exercida num quadro parlamentar que exigiria mais diálogo e concertação. O Povo se quisesse que o PS governasse e que António Costa fosse Primeiro-ministro tê-lo-ia dito nas urnas.

Não perceber esta mensagem é inverter e desrespeitar o mais elementar alicerce da Democracia: a vontade do Povo. E criam um precedente grave e de consequências futuras imprevisíveis. O que se esperaria dos partidos que perderam as eleições, especialmente do PS, era humildade democrática e disponibilidade para o diálogo, como várias vezes aconteceu em Portugal com governos minoritários no Parlamento.

2. António Costa percebendo a grande derrota que obteve nas urnas, depois das altas expetativas que lançou junto dos seus camaradas, com a contribuição de muita comunicação social que não se fartou de o incensar e declarar antecipadamente vencedor, depressa montou uma estratégia para cuidar da sua sobrevivência política. Ele sabe que se não for 1º Ministro não continuará a ser líder do PS.

No fundo António Costa repete a estratégia que o levou a líder do PS, quando assaltou o poder e afastou António José Seguro. E, pelo caminho, fez o mesmo com Sampaio da Nóvoa, dando-lhe todos os sinais de apoio para, depois recuar, por mero tacticismo e interesse. Portanto, este assalto ao poder do País é para António Costa apenas mais um episódio revelador do seu caráter político que tem como único objetivo garantir a sua sobrevivência e a da entourage que o acompanha, da qual se destaca Carlos César, também ele um habitué em afastar do caminho quem o incomoda…

Para esta liderança do PS, apoiada pela esquerda radical (que aparentemente até está disposta a abdicar dos seus princípios e das suas principais bandeiras eleitorais) vale tudo. Aproveitam as circunstâncias de o Presidente da República estar em fim de mandato e com os seus poderes de intervenção limitados, e armaram este assalto ao poder, confiando que o seu exercício fará o povo esquecer depressa a baixeza do golpe. Enganam-se! Mais cedo ou mais tarde vão ser avaliados por isso.

3. E o País? Para eles que se lixe o País. Nem a situação delicada em que se encontra Portugal os faz recuar ou repensar esta estratégia. A ânsia de poder é de tal ordem que esquecem e desrespeitam os enormes sacrifícios que os portugueses fizeram nestes últimos quatro anos para retirar o País da situação de quase bancarrota em que a governação do PS nos havia colocado. A situação de Portugal é demasiado frágil para estes aventureirismos irresponsáveis que invariavelmente farão com que sejam sempre os mesmos a pagar.

A verdade é que as eleições aconteceram há um mês e o País está ainda sem um governo em efetividade de funções e pelo que é possível antever, fruto dos jogos palacianos em curso, assim continuará por mais algum tempo. Se a este período adicionarmos o que antecedeu as eleições, em que o anterior governo esteve com competências limitadas, chegamos à conclusão que é tempo de mais para substituir um governo. Olhemos para a velocidade em que um processo semelhante decorreu recentemente na Grécia. A situação do País exigiria outra responsabilidade dos políticos e outra celeridade.

4. Neste processo apreciei a declaração inicial e lúcida do Presidente do PS/Açores. Vasco Cordeiro disse que face aos resultados eleitorais o PSD e o CDS-PP é que deveriam governar. Porém, com o evoluir da situação nacional, Vasco Cordeiro depressa percebeu que há no PS/Açores quem manda mais do que ele. Carlos César obviamente deve ter-lhe lembrado quem é que o colocou em Presidente do PS/A. E que também o podia retirar.

Resultado: Vasco Cordeiro meteu a viola no saco e refugia-se em generalidades, pois já percebeu que os deputados do PS eleitos pelos Açores para a Assembleia da República não lhe iriam obedecer mas sim a Carlos César. Só isso justifica que com subterfúgios regimentais, de que a Presidente da Assembleia Regional mais uma vez foi cúmplice célere, tenha fugido ao debate sobre esta matéria no último plenário. Vasco Cordeiro perdeu uma grande oportunidade para se afirmar e se autonomizar em relação a Carlos César. Mais uma vez hesitou e perdeu.

5. Termino com a pergunta que mais me têm feito: afinal para que servem as eleições? E com a resposta que tenho ouvido de muitos: se é para isso não vou lá mais!