Vinte anos de conjunturas – Opinião de João Bruto da Costa

A felicidade geral com a melhoria de alguns indicadores económicos nos Açores, com destaque para a diminuição do número de inscritos nos centros de emprego, não consegue, infelizmente, ofuscar uma realidade económica e social nos Açores que devia envergonhar governos que, instalados há duas décadas nos destinos dados a milhares de milhões de euros, se limitaram a manter um regime que perpetua situações de pobreza e níveis de desigualdade insustentáveis.

Nessa medida, quando a cada momento avaliamos o desempenho de um regime político com duas décadas, as análises conjunturais feitas em ciclos marcadamente eleitoralistas acabam por confirmar que o modelo apenas resulta para uma classe dirigente, demasiadamente agarrada ao poder e viciada em manter dependências ou criando-as para sua satisfação partidária.

No presente, há resultados positivos em alguns indicadores económicos directamente relacionados com a nova realidade nas ligações com os Açores e com a redução de impostos anunciada em 2014 e concretizada em meados de 2015.

Não sendo especialista na matéria, é do senso comum que, numa análise simplista, a economia rege-se por expectativas e assim como um anúncio de aumento de impostos dentro de seis meses começa a fazer efeito na economia desde que se preveja esse aumento, também um anúncio de baixa de impostos, aliado a uma projectada concretização de um novo modelo de ligações com o exterior, criam um clima económico favorável potenciando, desde logo, alguma recuperação de alguns indicadores.

Veja-se que, no caso dos Açores, até antes do novo modelo de ligações aéreas entrar em vigor, a SATA e TAP, únicas companhias então a voar para os Açores, logo começaram em campanhas e reduções de preços procurando garantir mercado antes da concorrência, por isso não é preciso saber de cor o manual de Samuelson ou outro brilhante economista para perceber que as coisas funcionam simplistamente assim, na ditadura das expectativas.

Esses resultados conjunturais são obviamente positivos e isso mesmo não nos afasta de um olhar verdadeiramente interessado na realidade dos Açores e nos resultados que, não sendo conjunturais, definem a forma como perdemos muito dinheiro e tempo a alimentar um regime esgotado no seu próprio modelo de poder.

Porque a realidade dos Açores de há muito tempo é a região não deixar a cauda dos indicadores do país no campo do desenvolvimento humano e no combate à pobreza e desigualdades. E onde se registam melhorias, muitas vezes, as outras regiões conseguem melhorar ainda mais, deixando-nos novamente lá para trás.

Podemos reduzir conjunturalmente um desemprego ainda escandalosamente elevado, mas se olharmos a que 22 900 crianças e jovens dos Açores recebem o abono de família que, recorde-se, num dos PECs de Sócrates passou a contemplar apenas aqueles agregados com rendimentos mais baixos, se não ocultarmos que 50 mil idosos recebem em média menos de 350 euros por mês, ou seja, mais de 100 euros a menos do que é considerado um rendimento abaixo do limiar da pobreza, e se não nos perdermos em fabulações quando notamos que 70 mil açorianos estão isentos de taxas moderadoras por insuficiência económica, ou se tomarmos consciência de que no RSI os Açores têm o triplo da média nacional de beneficiários deste apoio social, percebemos imediatamente que há muitas conjunturas que podem ajudar, mas temos de querer, verdadeiramente, mudar esta realidade.